Tenho uma
história do meu pai para contar. Eu deveria ter uns quatro anos de idade. A
televisão emplacava na rua da minha casa. O Sr. Orlando a tinha como mais um
eletrodoméstico entre as novidades da época, e não passava disto. O que ele mais gostava era de
música, e isso o fez comprar uma radio vitrola linda. Estávamos na década de
cinquenta.
Depois da
missa de todo santo domingo, ele passava em uma antiga charutaria em frente da Igreja da Vila Arens. De lá ele voltava pra
casa com um pacote de frágeis discos de carnaúba em 78 rpm. Na parte da tarde a
nossa sala de visitas ficava lotada de gente para ouvir música. Adultos e
crianças iam chegando e entrando. Sempre tinha alguém na porta dizendo:
- Com
licença seu Orlando.
As crianças
iam vestidas com primor. Lembro-me das meninas com saias rodadas e meias três quartos
sobre os sapatos. O tradicional café com bolo caipira era religiosamente servido.
As bolachas champanhe era a grande
sensação entre a garotada.
Em uma
daquelas tardes encantadoras onde o tempo escorria mais que devagar, ouvi meu
pai dizendo que o disco que ele colocaria a seguir era um compositor muito
conhecido. Ele toca cavaquinho.
- Já sei que
música é, Sr. Orlando. É “Brasileirinho”.
A música
fora composta em 1947 e era o maior sucesso da história do chôro, mais até que Tico-Tico
no Fubá de Zequinha de Abreu.
- Certo, respondeu
o meu pai. Ele seguiu contando que o Waldir Azevedo estava sem um jogo de
cordas para o seu cavaquinho e nele só havia a primeira delas de baixo para
cima. Foi assim que ele, em uma única corda criou “Brasileirinho”.
Embora
aquelas tarde musicais se transformassem em encontro social e de prolongadas
conversas entre os adultos, fez-se silêncio para ouvir aquela música, e eu me
orgulhei do meu pai, pois senti que ele contara a história para ouvir a música
do jeito que ele gostava, em silêncio. Quando a radiovitrola parou de tocar,
ninguém ousou falar nada. Todos estavam tomados pelo “Brasileirinho”.
- Põe de
novo, Sr Orlando.
JRToffametto
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