Conto do ruído mental
Um conhecido me abordou estabanadamente no meio da rua e, de chofre, foi perguntando-me do Dr. Ramos.
- Lamento, mas não o tenho visto ultimamente.
- Então... é que não consigo encontrar o remédio da
paciência em nenhuma farmácia, tô achando que não existe. Assim que o ver, por
extrema gentileza, peça-lhe a fórmula. Aqui está o dinheiro da consulta e o um
cartão com meu telefone de contato.
Bem, voltei encontrá-lo com a fórmula dentro de um envelope
lacrado e em branco. Estendi-o a ele e lhe disse:
- O doutor me pediu para te dizer que faça bom uso disto.
- Sim, sim, respondeu-me ele arrancando a receita do
envelope.
Sorriu ao ler e, enigmático, ficou parado à minha frente,
depois me virou as costas e partiu andando como a dar um passo de cada vez.
Empertigado, voltei ao consultório perguntando ao doutor o
que ele prescrevera ao meu conhecido.
- Qual foi a reação dele?
- Nada me disse, nem me agradeceu, virou as costas e foi
embora. Acho que mereço saber o que aconteceu.
- Vai me dizer que
você quer uma receita para resolver o enigma que o tomou?
- Cê tá brincando comigo, né!
- Nosso tempo se esgotou, disse-me ele olhando para uma
ampulheta. Dias depois encontro com o meu conhecido com o mesmo sorriso de
quando lera a receita. Disse-me ele:
- Este Dr. Ramos não existe.
- Tanto existe que ele te passou a fórmula da paciência que
pedistes.
- Cê me dá um abraço? Pois ele se adiantou e me abraçou
tirando o pó das minhas costas.
- Então funcionou? O que estava escrito dentro do envelope
que te dei? Como foi?
Só os seus olhos brilhantes é que me respondiam.
- Diga lá, meu caro, não me deixe ficar ansioso.
- Eu estava esperando por este dia, respondeu-me ele, e
puxou um papel da carteira e o desdobrou. Era um envelope igual ao que ele rasgara
ao recebê-lo de minhas mãos.
Adivinhando que era a fórmula da paciência, minha adrenalina
foi a mil. Estava colado pela aba. Arranquei o papel de dentro da carta. Nele
estava escrito:
"Comece pelo silêncio até esvaziar(-se) dentro e fora."
JRToffanetto
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