quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Bar Recanto Novo - Crônica (Parte 1)


Bar Recanto Novo
(Parte 1) 

Recanto significa canto afastado, retirado, menos à vista, esconderijo, e daí o fato dos botecos serem, quase todos, mau iluminados, cheirando à llingüiça, ovos cozidos, torresmo e  a... azedo do  indefectível mictório.

Lugar da pinga, da “mardita” com a qual muitos “matam o bicho” e todas as coisas que o comum dos mortais não consegue lidar, a começar consigo próprios.

Se você passa por uma porta aberta de um salão escuro, sem nome de identificação, e se depara com um cachorro coçando pulgas sob a soleira de entrada, pode identificar como um destes  “esconderijos” de pequenos e grandes pecados. Suas vistas precisarão se acostumar com o breu para ver o que ali se encontra.

Encostado ao balcão, alguém resmunga ao outro o seu mal-estar para com a vida. Dize-o sob a profundidade do palco de luz bruxuleante, e se der bobeira, é provável que te convide para “tomar uma”, beber do mesmo  fogo. A tirar por que o ouve, imagine-se com cara de cachorrão e de olhos mortiços qual o de sardinha frita.

Do outro lado do balcão, não será difícil ver aquele que, num extremo de delicadeza, nem tira o palito de dente do canto da boca ao bebericar a “branquinha”, a maldita. Depois se arrepia todo. A culpa é dela, né?!, deve ser, e depois joga no chão um pouco do aguardente para o santo. Pra quem tiver curiosidade para saber do santo protetor destes, basta imaginar.

De repente um gigante toma conta da porta de entrada e o boteco fica ainda mais escuro. Quem salivava a pinga dentro da boca não ousa engoli-la. Só se vê o branco de olhos sobressaltados. Econômico nas palavras, o brutamonte não faz questão de saudar seus comparsas da “aguardência”. No lugar de “bom dia”, apenas diz a última sílaba “dia”, seca, entre os dentes escuros, avisando que apenas está marcando presença, e que veio pra beber não pra conversar.

O mais fraquinho dos convivas, um magrinho cozido pela pinga, e com a barriga pronunciando cerveja, reverencia o grandão com a cabeça, mas no canto da boca e nos olhos emendados à sobrancelha, sorri com mil demônios, os ditos cujos a quem chamam de santo. E assim ele responde o cumprimento:
- Diabão (leia-se dia bom), mas não se engane, é mesmo o “coisa-ruim”.


Outro dia eu continuo esta crônica, a Parte 2.

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