Esta senhora desce a avenida com um matinho na mão. Olha pro
chão e depois para o barranco. O que vê, ou o que procura, uma muda de planta,
um tempero de cozinha, talvez o coentro, um galho de loro pro feijão? Ou será um pé de boldo, um capim santo (erva
cidreira) ou um chá de quebra pedra. Os pensamento dela estão com os seus
(família, vizinhos). Um deles precisa um chá disto e o outro daquilo. Ela cura
a má digestão deste, tira a dor muscular daquele e regula os intestinos de
alguém. À noite, antes de dormir, ela ferverá a erva doce para dormir melhor.
Ao se levantar ela tirará o chá de capim santo da geladeira e com ele embeberá
um chumaço de algodão para suavizar a olheira da filha antes que esta saia pra
trabalhar.
Pois esta mulher possui um saber trazido dos silvícolas há muitos
milênios antes do aparecimento do homem branco por estas plagas. A propósito, poderosas
multinacionais estão clandestinamente recolhendo estes conhecimentos lá na
“nossa” Amazônia e fabricando produtos fabulosos tanto na farmacêutica quanto em
cosméticos, patenteando “suas” descobertas e as colocando no mercado a peso de
ouro. Vale dizer que o Brasil está entre as três medicinas ayurvédicas do
mundo, as outras estão na Índia e na China. Chamamo-la de fitoterapia. Para o
interesse dos gringos que invadem nossas matas sem pedir licença, significa, um
conhecimento que encurta anos de pesquisa em laboratórios.
Aposto como esta senhora da foto também é “benzedeira” (vaydia na Índia). Aquela que depois de uma
reza junto ao paciente recomenda o uso de tais e tais plantas, mas se, por
exemplo, apenas recitar umas palavras contra “mau olhado” ou pra quem “pegou
ar” funciona também, mas se a pessoa estiver em prostração por causa de um “mau
olhado” daqueles, certamente ela recomendará um banho de chá de arruda, e não há religião nisto,
mas fé, religiosidade em vida, e alguns dos seus rituais, assim como na Índia,
desafiam o senso comum e a prática científica.
Ao ver esta senhora descendo uma moderna e movimentada
avenida da cidade, sinto-a como um tesouro e também um testemunho de que nossa
cultura autóctone ainda vive e que não morrerá tão cedo assim apesar do descaso
para com estes nos dias de hoje e que uma hora eu conto.
Nas pessoas, nos animais, nos barrancos e terrenos baldios
da cidade existem coisas a desafiar nossa pretensa sabedoria e outras que nem
sonha nossa imaginação. É preciso aprender com a mulher do guarda-chuva.
JRToffanetto
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