terça-feira, 22 de abril de 2014

Hilda Hilst (Lírica poética paulistana da segunda metade do séc.XX)


(1930-2004)









 
 
 
 
 
 
 
"...a fusão amorosa de um eu feminino com o outro
quanto a tentativa de redescoberta do ser humano
num espaço a meio caminho do sagrado e do profano,
tudo isso proferido por uma voz que é, ao mesmo tempo,
a do ser humano, a da mulher e a da poetisa,
à qual cabe 'a tarefa nomeadora,
a da palavra demiúrgica que cria o Real' (...)"
(Frederico Spada Silva - UFJF)
 
 
 


XIX (cantares)
Hilda Hilst

Corpo de carne
Sobre um corpo de água.
Sonha-me a mim
Contigo debruçada
Sobre este corpo de rio.
Guarda-me
Solidão e nome

E vive o percurso
Do que corre
Jamais chegando ao fim.

Guarda esta tarde
E repõe sobre as águas
Teus navios. Pensa-me
Imensa, iluminada
Grande corpo de água
Grande rio
Esquecido de chagas e afogados.

Pensa-me rio.
Lavado e aquecido da tua carne.
 
 
Rinoceronte 
Hilda Hilst
Rinoceronte elefante
Vivi nos altos de um monte
Tentando trazer teu gesto
Teu Horizonte
Para o meu deserto
 
 
Penso linhos e ungüentos 
Hilda Hilst
Penso linhos e ungüentos
para o coração machucado de Tempo.
Penso bilhas e pátios
Pela comoção de contemplá-los.
(E de te ver ali
À luz da geometria de teus atos)
Penso-te
Pensando-me em agonia. E não estou.
Estou apenas densa
Recolhendo aroma, passo
O refulgente de ti que me restou.
 
 
Hilda Hilst (1930-2004).  Poeta, ficcionista, cronista e dramaturga brasileira. Considerada pela crítica especializada como uma das maiores escritoras em língua portuguesa do século XX.
 
 

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